Regionalização
Os meus leitores sabem que não sou nenhum retrógrado e que não ando a clamar pelo passado. Sou independente e nem tenho saudades do Estado Novo nem da União Soviética. No entanto vejo tanta publicidade sobre um novo referendo do aborto (que não critico) e nunca mais ninguém voltou a falar na Regionalização.
Veja-se a conjuntura do referendo de 1998. PS e PCP eram a favor do Sim, o BE ainda não tinha lugar no parlamento, PSD e CDS apoiaram o Não. No entanto a posição do PSD em favor do Não resultou de uma péssima capacidade de negociação por parte da esquerda. O PSD estava no início a favor da regionalização, mas como o PS e o PCP aprovaram um mapa sem consultar a direita, passou para o lado contrario. Depois, as principais figuras do Sim tinham pouca simpatia junto da opinião pública nacional, veja-se o caso de Fernando Gomes. Porque não o regresso do tema?
Está a ser aplicada uma nova lei, que permite a concelhos vizinhos associarem-se em comunidades urbanas ou áreas metropolitanas consoante o número de habitantes. Mas este tipo de junção de vontades não apresenta nenhum tipo de vantagens. Podem existir concelhos esquecidos e que ficam isolados no meio de comunidades e áreas metropolitanas, as decisões dos orgãos governativos não tem em conta o peso da população (1 câmara = a 1 voto) pelo que se por exemplo, na Área Metropolitana do Porto os concelhos da Maia, Matosinhos, Gondomar, Valongo, Gaia e Espinho se juntassem, podiam ordenar a construção de um aterro no centro do Porto (hipótese absurda, como é óbvio), não existe ninguém a quem a população possa imputar responsabilidades com a força de uma votação directa, para além de outros problemas específicos. Este tipo de regionalização mascarada não terá qualquer utilidade e o seu futuro será o fim numa qualquer legislatura posterior.
Porquê a regionalização? Vou exemplificar com o caso do Grande Porto que é a minha região. Parece-me injusto uma câmara que representa 30 mil pessoas como Espinho tenha tanto peso como o Porto ou Gaia que têm mais de 200 mil pessoas. É muito mais democrático existir um voto por pessoa. Também é um pouco estranho existir um modelo em que acima de um orgão de poder que governa 30 mil pessoas estar um orgão de poder que governa 10 milhões de habitantes.
Na Área Metropolitana do Porto (AMP), a inexistência de um planeamento regional dificulta de sobremaneira o desenvolvimento sutentável (sim, também sei utilizar a palavra da moda). A população da cidade central diminui e a desertificação do principal pólo da AMP é preocupante para toda ela. A AMP só será forte se o seu centro for forte e não existir uma dispersão de forças. Todos os municípios e todos os cidadãos beneficiariam com um centro forte, mas como uma das principais fontes de receita das autarquias é a contribuição autárquica, algo proveniente da ocupação do solo e proporcional à população, cada câmara concorre entre si para aumentar a construção e chamar habitantes. Se em vez desta concorrência entre municípios rivais o imposto fosse regional, o planeamento seria muito mais correcto. Não existiria a desertificação da cidade do Porto, não existiria a construção desmesurada em todos os outros concelhos e o respeito pelo solo como bem precioso seria muito maior. Se o crescimento da AMP continuar desta forma, cada vez existirão mais edifícios novos, cada vez existirão mais zonas desertificadas e a população andará a saltar de casa para casa até chegarmos a um estado final onde não existirão pinhais, campos agrícolas ou espaços verdes, apenas edifícios e mais edifícios, zonas habitantes e zonas desertas. Penso que este momento nunca chegará, mas para que isso não aconteça algo tem que ser mudado.
Como o tema de momento deste blogue são as ETAR's, posso acrescentar que seria muito mais fácil decidir quais os melhores locais para estas estações e quais as suas capacidades ideais se existisse uma visão regional. Em Gaia existe uma ETAR para 200 mil habitantes, mas existem concelhos que têm um décimo dessa população, sendo mais fácil uma solução interconcelhia ponderada num poder regional.
6 espinhos:
Concordo com quase tudo. Hoje não me apetece discordar de ti, até porque já conversámos sobre o assunto vezes suficientes e estamos em sintonia. Gostei do que disseste sobre a importância da não-desertificação da metrópole, e da suburbanização contínua. Bolas para presidente!
El_gordo (adepto do centralismo, mas capaz de cedências)
Na minha opiniao, o grande problema da regionalização, é existirem tantas regionalizações diferentes! a educação tem uma, o ambiente e OT tem outra, foram criadas associações de municipios e entidades intermunicipais para gerir os residuos com outra organização... eu teria optado por oficilizar as organizações das antigas CCRN, já que eram as que tinham mais "poderes" (fundos comunitarios). mas a partir do momento que se optou pelas comunidades urbanas e areas metroplitanas, nao será de levar esta regionalização "até ao fim"?
As CCDR's (antes CCR's) coordenam a aplicação dos fundos do estado em determinada região. Numa regionalização a sua estrutura podia ser aproveitada. No entanto, seria muito importante existir um orgão regional que coordenasse as autarquias do que o que vai acontecer (as autarquias a controlarem um orgão regional). A Junta Metropolitana do Porto já existe há muito tempo e tem um funcionamento muito difícil. Por exemplo, o traçado do Metro seria muito mais regular se as câmaras não exigissem um traçado específico para o seu concelho. Veja-se o caso de Matosinhos, o metro anda aos "ésses" pela malha urbana sendo pouco utilizado para quem deseja ter uma ligação rápida e eficaz ao centro do Porto, que é sem mais nem menos a maior parte da população. Se existisse uma ligação muito mais directa do estilo Leça-Matosinhos-Srª da Hora-Trindade existiriam muitos mais clientes e o serviço seria muito melhor. Teria no entanto que existir um serviço de outros transportes que proporcionasse um bom interface com o metro, e é isso que as câmaras não fazem, porque lhes fica caro.
Por isso é que deveria exitir um orgão regional eleito pelos cidadãos que traçasse os planos de fundo sobre os quais funcionariam as políticas autárquicas. Se esse orgão existisse, a ROM não andaria aos empurrões, seria a entidade regional a classificar as áreas de paisagem protegida.
sobre isto, e reforçando a tua argumentação, há que referir a excelente iniciativa da CCDR que tem em curso um projecto para definir a estrutura ecológica fundamental do grande porto
A CCDRN é o mínimo que se pode exigir para existirem planos de desenvolvimento regional. No entanto não é um orgão de poder mas uma extensão do governo central. Quantas pessoas sabem o que é uma CCDR? Quantas conhecem o seu presidente? Na minha faculdade, e estou a especializar-me em Planeamento do Território e Ambiente, quase ninguém a conhece.
Uma pergunta, não seria mais fácil e até menos traumático, manter as fronteiras distritais e simplesmente fazer do governador civil um presidente regional com direito a orçamento e eleições directas? para que mapas e mapinhas feitos sabe-se lá como ou porquê, se já temos uma divisão territorial onde simplesmente falta um governo?
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