domingo, agosto 31, 2003

Bola



Aqui está uma forma original de eufemizar a derrota do Porto. Nada mais que enfatizar o grande feito de um jogador português. Não percebo é o facto de se terem esquecido de referir o Super Fernando e o Super Sérgio da quarta-feira anterior, preferiram chorar as mágoas de mais um ano sem liga dos campeões. Ainda bem que na Travessa da Queimada estava tudo a torcer por uma vitória do Rui Costa assim da próxima vez o aeroporto de Pedras Rubras estará cheio para apoiar os adversários do Benfica na UEFA, na Intertoto ou na Taça Amizade trazendo grandes fontes de receitas às Roulottes de Farturas e aos vendedores ambulantes da zona.

Os adeptos do Porto que receberam a Lázio nunca disseram ser isentos ou credíveis, os adeptos do Porto não eram jornalistas. Mas agora, quem agradece ao Super Rui são pessoas que dizem escrever a Bíblia da isenção desportiva. Parabéns! Desta vez ganharam 1-0! Para a próxima vê-se!

sexta-feira, agosto 29, 2003

Esperança

O Porto vai ganhar ao Milan. Ponto final.

quarta-feira, agosto 27, 2003

Atletismo

Nos Mundiais de Atletismo de Paris, surgiu uma nova moda, a contratação de atletas tal como se faz no futebol. O Qatar acabou de contratar ao Quénia dois jovens promissores a custo zero. Depois de vários meses de negociações, os atletas não chegaram a acordo com os dirigentes para a renovação do Bilhete de Identidade e ao abrigo da lei Bosman transferiram-se para a equipa árabe. Têm agora uma melhoria considerável nos ordenados e uma claúsula de rescisão altíssima. A nova coqueluche do deserto, Stephen Cherono, virou Saif Saaeed Shaheen e já prometeu ir ao Qatar uma vez de dez em dez anos e aprender a dizer Olá em árabe. É considerada a transferência do ano após ter ganho a corrida dos 3 mil metros obstáculos.
Quem pode estar de malas aviadas para a Papua Nova Guiné é Rui Silva, que exige uma melhoria das condições salariais, caso contrário rescinde o Bilhete de Identidade com Portugal. Já ameaçou assinar com a equipa Oceânica passando a chamar-se Makatumba Tumba Tumba e as suas capacidades prometem pulverizar os recordes nacionais daquele país, desde os 110 metros barreiras ao 3000m obstáculos, passando pelo salto à vara e pelo lançamento do dardo. É que por aquelas paragens ainda não se construiu uma pista de atletismo e é mais fácil investir na contratação de estrangeiros do que na dinamização do desporto local.
Viva a nova ordem mundial!

segunda-feira, agosto 25, 2003

Terra

Este estranho cheiro
De luz que é maré
Enche os meus pulmões
De calor
De frio
De vida
até me esquecer de tudo
E ficar só eu
E tu, que te estendes
Pelo imaginário
Tu, que seguras
Rios e mares
Choros e sorrisos
Bonanças que são tempestades
Príncipes que são sapos
Belas que são monstros
Sois que nascem no mar
Luas que acordam com o dia.

Permaneces
Igual
Eternamente igual
Olhando para tudo
E restando a mesma Terra
Uma Terra de Mar

sexta-feira, agosto 22, 2003

Slogan

Este ano não abandone os seus avós como animais.

1300 Mortos é demais.

quinta-feira, agosto 21, 2003

Arqueólogo

Carta a um arqueólogo do Futuro

Quando por entre pedras fatigadas
encontrares este papiro frágil amarelado
não quero que me julgues por ter vivido
na época em que vivi.
Nem quero que julgues uma época
do alto do teu século trinta e um,
sem saberes quem somos.
Nós, no meio de um bosque de estrelas
Só temos dois olhos
Só temos duas mãos

Ao lado desta carta que te deixo
deves encontrar Vénus de Brassempouy em Betão
Vitória de Samutrácia em televisão,
e a Vénus de Milo num centro comercial
o centro de um país que era Portugal
Mil anos passaram
Tens que compreender
Só temos dois olhos
Só temos duas mãos

Peço perdão pelo dióxido de carbono que libertei
Pelo oxigénio que consumi, pela obra que não deixei
Peço perdão por nós
(já que ninguém pede)
uma civilização que nada deixou
para ser estudada
não procures nada mais
deixa-nos em paz debaixo da nossa terra
não nos preocupámos contigo
não te preocupes connosco
só temos dois olhos
só temos duas mãos

Não há poetas para procurar
Não temos citânias nem ânforas
Temos cimento e vidro nu
Nada pudemos fazer
O nosso mundo é frio e cru
Somos tão frágeis como este papel
Somos tão fósseis como este papel
Somos tão velhos como este papel
No nosso tempo
estar preso é estar livre
Estar livre é estar preso
Por incrível que pareça
Temos dois olhos
Temos duas mãos

Por isso arqueólogo
Pega na pá e na terra
Enterra-me, por favor!
Enterra-me
E se ainda fores a tempo
E se ainda estiveres vivo
Salva o teu mundo
Procura a liberdade
Nós não conseguimos hoje
Agora tento acordar os de amanhã
Nós não temos nada
Estamos de baixo da terra
Mas tu,
Tens dois olhos
Tens duas mãos

E tens o mundo
Espero eu.

quarta-feira, agosto 20, 2003

Sangue

O que hoje ocorreu em Bagdad é desolador. Sempre contestei a guerra e seria fácil dizer agora que se os Estados Unidos não atacassem nada disto teria acontecido. Não deixaria de ser verdade, mas pouca importância tem. Porquê atacar a O.N.U.? Que ergueu voz contra a guerra, mesmo tendo sede em Nova Iorque? Atacar a ajuda humanitária? Atacar um brasileiro que só esteve presente em missóes de paz? Ontem e amanhã os culpados foram e serão aqueles que provocaram uma guerra, hoje os verdadeiros culpados são os homens que perpetraram o ataque. Não há adjectivos para classificar semelhante acto, não há razões para perguntar porquê? O pesadelo é a realidade, até quando?

sábado, agosto 16, 2003

Pergunta

Un jornalista pergunta a uma mulher que tinha a casa a cinco metros das chamas de um incêndio:
-Você hoje vai dormir descansada?
Sem comentários

sexta-feira, agosto 15, 2003

Justiça

Seja feita justiça, toda a segunda circular marece estar presente aqui no blogue!

Sporting

O Ricardo
tem os frangos a seu cargo,
defender não é o dom
do Nélson
e para o Tiago
um dia a titular é um dia aziago.
Para a direita contrataram o Mário Sérgio
que não alcançou um título régio
pois apareceu o Miguel Garcia,
da equipa B era o único que servia.
Para central têm o Beto
com cada balão que chega ao tecto
de um estádio em que ninguém joga
tão mal como o Quiroga.
O Anderson Polga
oferece prémios aos adversários como a amiga Olga.
Tal como o Rui Jorge
a abrir a auto-estrada para um Porsche
de um avançado craque
que fintou o Rochemback
e marcou um golito
desanimando o Paíto
com nome de maçarico
como o Toñito
que cai com o vento
do respirar do Rui Bento.
Cheio de ódio
fica o Custódio
ao ver o Carlos Martins,
duro de rins,
perder a bola provocando um tento
sem reacção do Paulo Bento.
Quem goza
com o Pedro Barbosa
é o Sá Pinto
quando se mete no tinto
por ser velho
e azelha como o Tello.
O Luís Filipe
é rápido como o bip-bip
mas com a bola fica tenso
e perde-a para o Lourenço.
Se disser que ele é avançado minto,
talvez só comparável ao João Pinto
a mergulhar no mar de besugo
que afogou o Hugo.
Quem parece sardinha viva
é o Silva
ao lado do Clayton
quando comem um leitão
num restaurante podre onde ninguém vai
só eles e o Niculae
porque a comida sabe tão mal
como o Sporting Clube de Portugal.

quinta-feira, agosto 14, 2003

Blogue

Fundei um novo blogue, este so meu, pretende falar sobre todos os tipos de assuntos com rima. Se a poesia abandonou a rima, porque nao utiliza-la noutros campos. Em cronicas ironicas ou em textos informativos? Sugiro uma visita! http://so-rima.blogspot.com

Apagão

Nova Iorque está às escuras, ou melhor, estaria se não fosse de dia. Desenganam-se os que pensam ser um atentado, de certeza que foi uma cegonha portuguesa que fez um ninho em cima de um cabo de alta tensão!

Incêndios

Agora deixando o humor de lado e falando do que é importante e trágico.
Pode-se dividir a génese dos incêndios em 2 grandes grupos:
-Incêndios provocados por factores aleatórios
-Incêndios provocados por mão criminosa
Analisemos então cada caso:

Incêndios provocados por factores aleatórios

Estes incêndios são provocados por factores naturais, casos de trovoadas ou então pela negligência humana, por exemplo deixando cigarros acesos nas matas. A sua existência não pode ser evitada, mas a área ardida pode ser reduzida através da prevenção. Esta prevenção é feita ao longo do ano inteiro e não nos meses de Verão, deve ser planeada e publicada nos Planos Regionais de Ordenamento no Território, que ainda são uma miragem no nosso país. A área ardida neste ano, deve-se em grande parte à falta de planeamento e à contenção de despesas do governo. Se se apostasse mais na prevenção, gastar-se-ia muito menos do que se vai gastar na recuperação. Não era por uma limpeza geral das matas nem pela construção de corta-fogos que o défice iria aumentar. Agora não há nada a fazer, apenas planear para que nunca mais volte a acontecer.

Incêndios provocados por mão criminosa

Este grupo pode-se dividir em dois sub-grupos, aqueles em que a mão criminosa tem interesses económicos e aqueles em que a mão criminosa não pretende obter lucros do incêndio.
No primeiro caso, cabe à Polícia Judiciária investigar, mas pergunto-me: sempre que acontece um incêndio não se deverá começar a investigar por aqueles que poderão lucrar com ele?
No segundo sub-grupo, os incêndios são provocados por pessoas que têm na maior parte dos casos problemas do foro psiquiátrico, ou então, pessoas que desejam obter uma certa notoriedade provocando factos absurdos e ignóbeis. Neste caso penso que pode existir uma certa influência dos media, imagens de uma terrível beleza que preenchem uma hora de telejornais podem incentivar essas pessoas a cometerem crimes. O empolamento dos factos, a busca constante da notícia, mesmo que não existam palavras para a descrever, podem ser um foco gerador de incêndios, as pessoas podem querer transportar para a sua mata o que vêem na televisão.(Entre parêntesis queria condenar as entrevistas feitas a pessoas que perdem tudo, pelo menos a privacidade de chorar devia ser dada a essas pessoas, deve ser terrível perdermos as poucas coisas que temos e logo a seguir surgirem reporteres a quererem roubar-nos o que nos resta, as lágrimas)

Incêndios

Vamos pôr os pontos nos i's na matérIa dos IncêndIos:
matéria dos incêndios.
Já está!

terça-feira, agosto 12, 2003

Benfica

Um poema inspirado em Paulo Abrunhosa

O Moreira
tem uma churrasqueira
e o Bossio
só pensa no ócio
O Armando
vai para o banco de vez em quando.
Quem não come o farnel
é o Miguel
enjoado por perder
com as fífias do Hélder.
E o Ricardo Rocha
joga de galocha
pela água que mete o Argel
ao não cumprir o seu papel.
Quem só joga uma vez por ano
é o Cristiano,
o Petit
só dá pau e não se ri
mas é melhor que o Tiago
que só marca se for bem pago.
Ocupa o lugar do Anderson
que nem por sombras é bom.
Nem o Fernando Aguiar
que fica a ver a bola passar
ou o Carlitos,
para ele a bola tem picos.
Agora têm o Alex
que comprou as pernas à Domplex.
Há ainda o Zahovic,
correr atrás do João Pinto é o seu tique,
na posição do Roger,
pronto a ser vendido a quem alguma coisa der,
nem que seja o Dani
que bebe tanto como o Geovanni.
Mas pior que o Simão
que queria ser capitão,
nem mesmo o Fehér
a jogar só com um pé.
Quem marca golos é o Nuno Gomes
mas só a guarda-redes com poucos nomes,
como o Costinha que está nas Masmorras
com o Mantorras
por não defender uma bota
saída do pé do Sokota
que na bola não consegue acertar.
Por tudo isto é que o Benfica foi ao ar.

segunda-feira, agosto 11, 2003

Supertaça...

...ou uma profecia para o Euro 2004

Ontem fui a Guimarães ver a Supertaça entre o Porto e o Leiria no reconstruído Estádio D. Afonso Henriques. Mas de reconstruído só se pode falar do poeirento estádio, porque quanto à organização, essa continuava a ser a mesma dos tempos da Dona Urraca. Não vou falar daquele estádio que não tem paineis electrónicos, com uma camada de poeira sobre ele comparável a pirâmide egípcia enterrada na areia e sem um único cesto de papéis ou balde do lixo, afinal são coisas que se corrigem com facilidade e como ontem não ia jogar nem o Guimarães, nem o Benfica e tão pouco era um jogo do Europeu entre o País de Gales e a Bulgária, era lógico que ninguém se preocupasse pelas míseras trinta mil pessoas que viram o jogo.
Também podia falar dos Seguranças do estádio (que agora lhes chamam Stewards para as pessoas se esquecerem que aqueles homens são pessoas que sempre sonharam ser da GNR e chumbaram nos testes físicos por falta de bigode ou de barriguinha), mas lá por barrarem a entrada a crianças de cinco anos acompanhadas dos pais, por gostarem de pegar em repórteres pelos colarinhos e por deixarem o público invadir o campo com alegria, penso que tiveram sucesso no seu trabalho e não tenho nada a dizer deles, até porque tiveram uma excelente ajuda da polícia. Sim, a polícia que estave em grande, um número espantoso de agentes, consegui vislumbrar quase nove polícias dentro do estádio, todos muito atentos ao que se passava no relvado. Se o Bilro discutisse com o Deco ou o Vítor Baía desse uma bofetada de luva branca ao Ludemar eles estariam prontos a intervir, mas como isso não aconteceu limitaram-se a observar um jogo que não dava na televisão.
O único defeito que poderia apontar a toda esta fantástica organização seria o trânsito, mas nem este causou grandes incómodos. Qual é o problema de se demorar uma hora para percorrer o longo caminho de duzentos metros entre o lugar de estacionamento e a saída do parque que está dentro do estádio? Nenhum, só põe lá o carro quem quer, cá fora existem inúmeros locais, basta estacionar a uns dez quilómetros da cidade que se arranja lugar com facilidade. E demorar outra hora entre Guimarães e Famalicão pela Auto-Estrada? Até estava uma fila pequena nas portagens de Guimarães que apenas parou o trânsito na cidade à hora de ponta (dez da noite de domingo). E em Famalicão a fila de automóveis no acesso à Auto-Estrada Porto-Braga só tinha uns três ou quatro quilómetros, nada de extraordinário. Os automobilistas portugueses são incríveis, porque é que será que não aguentam um facto tão normal como demorar duas horas a percorrer um caminho que em situações normais se faz em quinze minutos? Já não ouvia tanta buzinadela por metro quadrado desde os tempos aureos da Ponte 25 de Abril.
Podia ter dito muita coisa, mas scabei por não falar de nada neste texto, porque pouca importância tiveram estes acontecimentos na minha vida, foi apenas uma óptima tarde de domingo com sabor a Euro 2004 e que se prolongou até à meia noite.

domingo, agosto 10, 2003

Conto

O posfácio que é prefácio.
Estamos perante um posfácio por ser escrito e aparecer publicado numa data posterior ao conto, mas também perante um prefácio porque quem ler a página de cima para baixo encontra primeiro estas palavras e só depois o conto em si.
Este conto é uma crítica à teoria da mão invisível de Adam Smith, que pode ser considerado o fundador da economia clássica. Ainda existe muito neoclassicismo na economia actual, tantos anos depois ainda acreditam nas virtudes de uma mão invisível. Esta mão não tem virtudes, como viram ou vão ver.

sábado, agosto 09, 2003

Palavra

Caso não tenham reparado, todos os títulos do blogue têm apenas uma palavra. Quanto menos palavras maior o valor de cada uma, quanto menos palavras, maior a abrangência de cada uma, quanto menos palavras mais arte.

quinta-feira, agosto 07, 2003

Conto

Mão Invisível (Versão completa)

José era carpinteiro porque seguira a arte do pai, aliás o seu nome não tinha caído do céu, era uma homenagem que o progenitor fez ao mais famoso profissional da área. A sua carpintaria ficava perto do centro da aldeia de Madeira. Era uma aldeia que tinha nome de ilha, mas o único mar que a rodeava era um mar de montanhas e de isolamento. As casas de Madeira, como o nome indica, eram todas de pedra e de apenas um piso, incluindo a própria carpintaria de José. As casas tinham este material porque todos os habitantes da povoação sabiam que para construir casas de pedra não necessitavam de matar nenhum ser vivo. Então, porque é que existe uma carpintaria em Madeira se ninguém quer matar seres vivos? Porque as portas de pedra que as pedreiras faziam eram demasiado pesadas para a população idosa as abrir. E como em Madeira não existia mais nenhuma matéria prima para além das rochas e do material homólogo à localidade, tinham que ser construídas portas de madeira. Foi assim estabelecido um código de ética pela Junta de Freguesia, postulava que cada casa teria que possuir oitenta porcento de portas de pedra e vinte porcento de portas de madeira. Era a forma dos idosos poderem sair dos quartos onde dormiam e dos pinheiros das montanhas que rodeavam Madeira poderem continuar a dar frescura ao ambiente da zona.
Sendo o único carpinteiro de Madeira, José tinha a função de fazer e reparar os tais vinte porcento de portas da aldeia. Às diversas pedreiras existentes cabia construir as casas e as portas restantes. Era o modo de todos os habitantes terem emprego, a maioria trabalhava nas pedreiras, existiam comerciantes e agricultores, pastores e lenhadores, professores e funcionários da Junta, e ainda o padre e José. Não era uma aldeia perfeita, existiam problemas como há em tantas outras, era uma aldeia quase vulgar, com os seus arraiais, as suas festas do padroeiro com cantoras e bailarinas, foguetes e vacas de fogo, as únicas diferenças eram a existência de emprego para todos e o facto de ninguém necessitar de morar na Grande Cidade e tirar um curso para crescer, a vida tratava de ensinar tudo o que as pessoas não sabiam.
Como em todas as histórias, algo rompeu o equilíbrio. Num belo dia de Março, com um calor abrasador, chegou a Madeira uma carrinha de caixa aberta que trazia um novo habitante para a aldeia. Era Joaquim, filho de outro Joaquim que emigrara para França em novo. Trazia placas de alumínio e estava disposto a abrir uma serralharia com as portas mais leves que existiam em todo o mundo. Passados uns meses a sua casa estava construída, tinha as portas de pedra obrigatórias, mas à vista de todos colocou uma enorme porta de alumínio resplandecente pintada a côr de rosa e dois portões também metálicos, pintados de amarelo para condizerem com o muro côr de laranja e os patinhos lilazes de porcelana que pôs à entrada. A sua oficina de serrelharia era dentro de casa, e a grande inovação tecnológica começou a atrair a população, que pretendia substituir as suas portas de pinho pelas de alumínio resplandecente.
Quem não gostou muito da ideia foi José, que via a sua clientela extinguir-se. A directiva da Junta de Freguesia exigia um mínimo de portas de pedra, mas não dizia que as restantes deveriam ser de madeira. Acabou por chegar ao dia em que só tinha mais um trabalho a fazer, por sinal para o seu irmão, que com pena de José tinha pedido uma porta para a casota do seu cão. Quando o carpinteiro começou a trabalhar, olhou para a tábua de madeira com lágrimas nos olhos, José tinha quarenta anos e muito que dar à vida, o que iria fazer depois? Pegou no serrote de pedra e começou a cortar a tábua com a força da tristeza, serrou-a num bater de asas e meia tábua caiu no chão com estrondo. Pousou o serrote e pegou nela com violência. Algo estava diferente, a tábua parecia levitar e a sua mão desaparecera. Deixou cair a madeira e num grito tentou estalar os dedos dessa mão, ouviu o som e ficou mais descansado. Não tinha serrado a mão, afinal a mão desaparecida era a que segurava o serrote e não havia qualquer vestígio de sangue. O seu braço terminava no pulso, mas podia bater palmas e pentear o cabelo como antes.
Correu para dentro de casa, foi ao quarto de banho e o espelho não enganava, a mão tinha desaparecido. Com um alfinete picou o que seria o dedo polegar, sentiu uma dor espinhosa e um liquido quente a jorrar, mas nada visível, a existência da mão resumia-se a quatro sentidos, o quinto tinha ficado algures junto da futura porta da casota do cão.
Como bom católico que era, José quis logo falar com o padre acerca da sua patologia. Se existe a doença dos pezinhos então esta seria a doença da mãozinha desaparecidinha. Nem o senhor padre conhecia algo assim, tinha cumprimentado José sem olhar para a mão e quando este a mostrou, o sacerdote nem queria acreditar no que não via.
-É um sinal de Deus, Ele quer-te dizer que nunca soubeste dar a mão a quem precisa, por isso retirou, não deste o devido uso.
-Mas Ele não me retirou a mão, ela continua cá mesmo tendo desaparecido.
-É porque Deus te quer dar uma segunda a oportunidade, utiliza-a para ajudar os outros e a tua mão reaparecerá.
José, olhando para a mão que não via, despediu-se do padre e começou a pensar no que este lhe dissera. Pareciam argumentos inacreditáveis, não tinham qualquer nexo, porque haveria Deus de escolher José para ter uma mão invisível? Já não bastava o fim do negócio que ainda ia ficar com a vida amputada de esperanças, o destino era tão padrasto. Mas se o Padre disse que José devia dar a mão a mais alguém é porque tem razão. Mesmo que não o pareça. Deus devia ter escolhido o pároco da aldeia para seu interlocutor, às tantas apareceu num sonho e disse:
-O José vai ter uma mão invisível, diz-lhe para ajudar os outros.
-Assim o farei Senhor
Por isso é que os padres têm uma vocação especial, Deus deve-lhes dizer estas coisas, pensou José apóss de ter imaginado o sonho do pároco. Nada mais restou ao carpinteiro do que procurar pessoas por toda a aldeia para ajudar utilizando a sua mão invisível. Encontrou algumas velhinhas que queriam atravessar a estrada de pedra e ajudou-as a caminhar, encontrou alguns gatos em cima das árvores e ajudou-os a descer, encontrou algumas crianças à procura de uma bola de futebol e ajudou-as a encontrar, encontrou o serralheiro que lhe estragou o negócio e não o ajudou, deu-lhe um soco no nariz. Depois foi ajudar as velhinhas que tinham atravessado a rua e que queriam regressar ao outro lado, os gatos que afinal não queriam estar cá em baixo mas sim em cima das árvores e as crianças que afinal estavam à procura de uma bola de básquete e não de futebol. O serralheiro não voltou a encontrar porque tinha ido para o hospital e a mão invisível, invisível estava. Esteve um dia inteiro tentando ajudar as pessoas, mas depois chegou à conclusão que a utilidade da sua mão era nula. Desde que se tornara invisível, todas as ajudas eram infrutíferas, erradas e às vezes até desrespeitadoras, caso de uma velhinha que não queria atravessar nenhuma rua e que a mão arrastou-a para o outro lado sem complacências e sem o controlo de José.
José sentiu que a mão invisível não era capaz de ajudar ninguém, não conseguia sequer cortar uma nova tábua para a casota do cão, a mão invisível não servia para nada na aldeia.
-E eu, sirvo para alguma coisa?
Perguntou José à sua mão. Ela não lhe respondeu, porque se não servia para nada então também não servia para falar. Por isso o ex-carpinteiro decidiu ir à cidade para ver se podia dar um novo destino à sua vida, talvez lá encontrasse quem lhe desse uma mão. Tinha esperança de encontrar uma daquelas empresas fictícias que lavam dinheiro com mão de obra invisível, ele seria a solução para os seus problemas. Como José não tinha morrido, ainda tinha essa esperança sobrevivente quando estava na paragem de autocarro à espera do transporte para a cidade. O pior aconteceu quando chegou o veículo, o autocarro estava cheio e ninguém quis sair para entrar uma pessoa com a doença da mãozinha desaparecidinha, ninguém se deslocou para a porta de saída, e o autocarro seguiu viagem sem José. Agora via o fim a chegar, só na semana seguinte haveria um novo autocarro que o levasse à cidade, e decerto também estaria cheio, a desilusão era enorme, de dimensões que começavam a atingir a linha do desespero.
As lágrimas chegaram a casa e com elas vinha José, enxugou os olhos mas as gotículas de água pareciam suspensas no ar quando olhou para o lugar da mão. Teve que limpar as lágrimas na cozinha e quando estava a secá-las viu algo que podia mudar a sua vida, as luvas de borracha. Pegou numa delas e escondeu a sua mão invisível, agora estava ali uma luva que dava forma ao membro desaparecido. Não hesitou no momento seguinte, a carpintaria estava à sua espera, era a altura de testar o regresso de uma mão visível. Amarela, mas visível. A luva pegou no serrote e cortou as tábuas a metade, depois cortou essas metades a meio, continuou a obra, cortando-as ao quadrado, ao cubo, à quarta e à quinta, e só parou quando existiam milhares de pedacinhos espalhados pelo seu local de trabalho. Juntou-os e pressionou-os, estes não se fizeram rogados e uniram-se como os homens nunca se conseguiram unir. Tinha inventado um novo material mais leve que a madeira, mais barato que o alumínio e decidiu dar-lhe o nome de Contraplacado. Substituiu de seguida a porta de sua casa por uma de Contraplacado para que todos vissem, ao fim do dia chegaram as primeiras encomendas. O serralheiro estava no hospital com a cana do nariz partida, e a construção civil precisava de novas portas.Todos ficaram impressionados com a leveza e o baixo custo das portas de Contraplacado e ao fim de dois dias não existiam portas de alumínio na aldeia exceptuando as da casa do serralheiro. Ninguém mais soube ao certo o que aconteceu a Joaquim, apenas se ouviram boatos. Disseram que construiu um nariz de alumínio e abriu na cidade um negócio com todo o tipo de próteses metálicas, mas isso nunca foi provado, pois ninguém mais conseguiu ir à cidade porque o autocarro estava sempre cheio.

Incêndios

Eu não queria falar deles, mas penso que devo explicar um exemplo prático que aconteceu aqui perto de mim.
Há cerca de três ou quatro anos, arderam os pinhais ao fundo da minha rua. Nada de especial, todos os verões há incêndios, e formando um grupo de populares conseguimos impedir que o fogo chegasse às casas e os bombeiros apesar de alguns atrasos foram sempre apagando o que restava. A única particularidade foi o facto de existirem incêndios todos os dias durante uma semana e começarem às três da tarde. Não estou a insinuar que fosse fogo posto, de certeza que existia um cigarro qualquer mal apagado com o relógio a despertar para essa hora ou então um vidro que acendia a caruma com pontualidade britânica.
Soube mais tarde que estava em curso uma revisão do Plano Director Municipal (PDM) e quando este saiu em Diário da República, o pinhal passou de Reserva Agrícola (Sem possibilidade de construir) para solo apto para a construção. Hoje existem duas novas ruas e foi feito um loteamento para dezenas de moradias, algumas delas já estão construidas.
Neste texto apenas relatei os factos, não tirei nenhuma conclusão, mas deixem-me fazer estas perguntas:
E se não tivesse existido incêndio, seria agora um solo apto a construir?
Quantos incêndios existem pelas mesmas razões?
Para quando uma verdadeira investigação sobre os grandes negócios que se fazem com os incêndios?

Conto

Mão Invisível (3ªParte)

José sentiu que a mão invisível não era capaz de ajudar ninguém, não conseguia sequer cortar uma nova tábua para a casota do cão, a mão invisível não servia para nada na aldeia.
-E eu, sirvo para alguma coisa?
Perguntou José à sua mão, ela não lhe respondeu, porque se não servia para nada então também não servia para falar. Decidiu ir à cidade para ver se podeia dar um novo destino à sua vida, talvez lá encontrasse quem lhe desse uma mão. Tinha esperança de encontrar uma daquelas empresas fictícias que lavam dinheiro com mão de obra invisível, ele seria a solução para os seus problemas. Como José apesar de ter uma mão invisível não tinha morrido, ainda tinha essa esperança sobrevivente quando estava na paragem de autocarro. O pior aconteceu quando chegou o veículo, o autocarro estava cheio e ninguém quis sair para entrar uma pessoa com a doença mãozinha desaparecidinha, ninguém se deslocou para a porta de saída, e o autocarro seguiu viagem sem José. Agora via o fim a chegar, só na semana seguinte haveria um novo autocarro que o levasse à cidade, e decerto também estaria cheio, a desilusão era enorme, de dimensões que começavam a atingir a linha do desespero.
As lágrimas chegaram a casa e traziam José, enxugou os olhos mas as gotículas de água pareciam suspensas no ar quando olhou para o lugar da mão. Teve que limpar as lágrimas na cozinha e quando estava a secá-las viu algo que podia mudar a sua vida (ou o fim dela), as luvas de borracha. Pegou numa delas e escondeu a sua mão invisível, agora estava ali uma luva que dava forma ao membro desaparecido. Não hesitou no momento seguinte, a carpintaria estava à sua espera, era a altura de testar o regresso de uma mão visível. Amarela, mas visível. A luva pegou no serrote e cortou as tábuas a metade, depois cortou essas metades a meio, continuou a obra, cortando as tábuas ao quadrado, ao cubo, à quarta e à quinta, e só parou quando existiam milhares de pedacinhos espalhados pelo seu local de trabalho. Juntou-os e pressionou-os, estes não se fizeram rogados e uniram-se como os homens nunca se conseguiram unir. Tinha inventado um novo material mais leve que a madeira, mais barato que o alumínio e decidiu dar-lhe o nome de Contraplacado. Substituiu de seguida a porta de sua casa por uma de Contraplacado para que todos vissem, ao fim dos dia chegaram as primeiras encomendas. O serralheiro estava no hospital com a cana do nariz partida, e a construção civil precisava de novas portas.Todos ficaram impressionados com a leveza e o baixo custo das novas portas e ao fim de dois dias não existiam portas de alumínio na aldeia exceptuando as da casa do serralheiro. Ninguém mais soube ao certo o que aconteceu ao serralheiro, apenas se ouviram boatos. Disseram que construiu um nariz de alumínio e abriu na cidade um negócio com todo o tipo de próteses metálicas, mas isso nunca foi provado, pois ninguém mais conseguiu ir à cidade porque o autocarro estava sempre cheio.
(Fim)

Amanhã apresento uma versão corrigida, coligida e revista, espero que vos agrade.

terça-feira, agosto 05, 2003

Inovação

Agora os nossos visitantes podem colocar espinhos (Comentários) aqui no (ouriço cacheiro), basta carregarem no link que aparece no final de cada texto e já está, podem picar-nos à vontade! Temos é que comprar um lápis azul, mas como cá não há ditadores parece que deixaram de ser vendidos. Ou será que não?

domingo, agosto 03, 2003

Tempo

É verdade, falei ontem do tempo, aquele assunto que se fala quando não se tem assuntos para falar. Mas será assim um tema tão fútil? Só o é quando nos referimos ao tempo meteorológico, quando se discute o tempo das horas e dos minutos é um dos assuntos mais fascinantes. E se os dois tempos fossem um? E se Abril não existisse entre Março e Maio mas sim sempre que há águas mil? E porque é que aqueles dias de Março de trinta graus não se chamam Julho ou Agosto? Alguém inventou horas e minutos para classificar o tempo, mas uma hora pode ser uma eternidade ou um instante, o tempo é diferente para cada um e esta forma não é a ideal para o medir. Eu prefiro compará-lo (medir é comparar) com o tempo meteorológico ou com as marés por exemplo. Pena é que para trabalhar tenha que cumprir horá rios e não tempó rios ou maré rios. Preferia antes funcionar com o meu relógio de chuva, mas não me deixam!

Conto

Mão Invisível (2ªParte)

José correu para dentro de casa, foi ao quarto de banho e o espelho não enganava, a mão tinha desaparecido. Com um alfinete picou o que seria o dedo polegar, sentiu uma dor espinhosa e um liquido quente a jorrar, mas nada visível, a existência da mão resumia-se a quatro sentidos, o quinto tinha ficado algures junto da porta da casota do cão.
Como bom católico que era, José quis logo falar com o padre acerca da sua patologia. Se existe a doença dos pezinhos então esta seria a doença da mãozinha desaparecidinha. Nem o senhor padre conhecia algo assim, tinha cumprimentado José sem olhar para a mão e quando este a mostrou o sacerdote nem queria acreditar no que não via.
-É um sinal de Deus, Ele quer-te dizer que nunca soubeste dar a mão a quem precisa, por isso retirou-te, não deste o devido uso.
-Mas Ele não me retirou a mão, ela continua cá mesmo tendo desaparecido.
-É porque Deus te quer dar uma segunda a oportunidade, utiliza-a para ajudar os outros e a tua mão reaparecerá.
José, olhando para a mão que não via, despediu-se do padre e começou a pensar no que este lhe dissera. Pareciam argumentos inacreditáveis, que não tinham qualquer nexo, porque haveria Deus de escolher José para ter uma mão invisível? Já não bastava o fim do negócio que ainda ia ficar com a vida amputada de esperanças, o destino era tão padrasto. Mas se o Padre disse que José devia dar a mão a mais alguém é porque tem razão, os padres têm sempre. Deus devia ter escolhido o pároco da aldeia para seu interlocutor, às tantas apareceu num sonho e disse:
-O José vai ter uma mão invisível, diz-lhe para ajudar os outros.
-Assim o farei Senhor
Por isso é que os padres têm uma vocação especial, Deus diz-lhes dizer estas coisas, pensou José depois de ter imaginado o sonho do pároco. Nada mais restou ao carpinteiro do que procurar pessoas por toda a aldeia para ajudar utilizando a sua mão invisível. Encontrou algumas velhinhas que queriam atravessar a estrada de pedra e ajudou-as a caminhar, encontrou alguns gatos em cima das árvores e ajudou-os a descer, encontrou algumas crianças à procura de uma bola de futebol e ajudou-as a encontrar, encontrou o serralheiro que lhe estragou o negócio e não o ajudou, deu-lhe um soco no nariz. Depois foi ajudar as velhinhas que tinham atravessado a rua e que queriam regressar ao outro lado, os gatos que afinal não queriam estar cá em baixo mas sim em cima das árvores e as crianças que afinal não estavam à procura de uma bola de futebol mas sim de básquete, não voltou a encontrar o serralheiro para lhe dar outro murro porque este tinha ido para o hospital. Quanto à mão invisível, invisível estava. Esteve um dia inteiro tentando ajudar as pessoas, mas depois chegou à conclusão que a utilidade da sua mão era nula. Desde que se tornara invisível, todas as ajudas eram infrutíferas, erradas e às vezes desrespeitadoras, caso de uma velhinha que não queria atravessar nenhuma rua e que a mão arrastou-a para o outro lado sem complacências e sem o controle de José.
(continua)

sábado, agosto 02, 2003

Calor

Devia existir uma lei qualquer contra o calor, sobretudo nos fins de semana de Agosto quando as praias estão cheias. Está um trânsito imenso, não é algo que me importe porque moro perto da praia e só lá fui de carro três vezes em catorze anos, mas só de pensar em conseguir um local onde caiba um alfinete na areia dá-me logo vontade de suar. Bem, vou-me refrescar antes que o meu cérebro fique fundido. Logo à noite regesso com menos calor, espero eu.

sexta-feira, agosto 01, 2003

Explicação

Hoje não vai aparecer aqui a 2ª parte do conto ao contrário do previsto. Em primeiro lugar estou cansado de um dia demasiado quente, e em segundo lugar, não me agrada nem por sombras o que escrevi ontem. Claro que o vou acabar, pelo respeito por quem o leu, mas penso que a publicação foi demasiado impulsiva. Amanhã continuo, prometo!